Se eu não morresse nunca ! E eternamente buscasse e conseguisse a perfeição das coisas. (Cesário Verde 1855-1887)







segunda-feira, 30 de maio de 2016

UM ANO QUIXOTESCO



Todo brasileiro conhece algo de Dom Quixote, não é mesmo?
Trinta adaptações para o cinema, sabe-se lá quantas para o teatro — adulto e infantil —, o mesmo para a dança — em vários gêneros —, na música — da ópera de Massenet a Tom Zé —, na literatura infantil — desde Monteiro Lobato às adaptações para HQ —, e na obra original — com dezenas de edições no Brasil —.

Passados exatos 400 anos da morte de Cervantes, encontramos Dom Quixote e seu autor em qualquer veículo de comunicação que acessamos, nos informando sobre o criador e suas criaturas. Pesquisando na internet por expressões como “as mais importantes obras de literatura”, encontraremos no topo das listas a figura do engenhoso fidalgo.
E por que esse cavaleiro da triste figura é tão importante? Deixo para os especialistas responder em abstrato, mas aponto algumas respostas que alcancei concretamente.
Havia lido algo de Dom Quixote quando adolescente, parte da obra original publicada em alguma série colecionável. O fiz por curiosidade e por utilidade. Deixei de ser um total ignorante, andei uma casa à frente, mas desinteressei em seguir adiante no tabuleiro da literatura.
Recentemente — passadas algumas décadas — interessado que estou em me aproximar das letras, depois de uma vida de números, me interessei verdadeiramente por Dom Quixote, ao ponto de, a cada final de capítulo, necessitar de uma pausa para acalmar as elucubrações e fantasias que passavam em minha cabeça. E, logo após, sentir uma revolução interior descortinando e apontando nossas próprias quixotices. Quixotices estas que se manifestam individualmente, mas também no coletivo e na própria humanidade, quando nos envolvemos em inúteis batalhas — e verdadeiras guerras — contra inimigos só percebidos pela tolice humana.
O que também nos diz Cervantes é que podemos mudar o mundo, sem nos lançar — como seu tolo herói medieval — às disputas inglórias, mas sim denunciando e criticando a injustiça através da comédia e ironia, portando como armas apenas nossas ideias e a capacidade de transmiti-las pela escrita.

(Publicado no JC de 30/05/2016)

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