Se eu não morresse nunca ! E eternamente buscasse e conseguisse a perfeição das coisas. (Cesário Verde 1855-1887)







segunda-feira, 17 de agosto de 2015

DIÁRIO DE BORDO: SEGUNDA-FEIRA 17/08/2015, SÃO TOME



 Na companhia de Mendonça, - pediu para assim ser chamado -, que se apresentou as nove e meia, numa cruza de buggy com camioneta, a ideia era dar um giro na ilha, parando sempre que desejado. Saímos do hotel quase às 10h e vimos natureza muito bela, parecida com o nosso nordeste. Lembro de alguns nomes, como Ilhéu das Rolas, Boca do Inferno, Praia Jalé, Praia das Conchas, Lagoa Azul. Em cada local tomávamos um refresco com frutas típicas, exceto na praia das Conchas, onde ficamos um pouco mais e tomamos duas cervejas Creola com peixe frito, e sorvete de sap sap. Parece que é graviola, bem bom.


Eram passado 18h, e a claridade do dia já se recolhera por completo, quando voltamos ao hotel.  Convidei meu novo amigo a tomar uma cerveja, pois a sede pedia. Fazia 25°C e o ar era úmido, mas uma leve brisa vinha desse mar imenso que envolve essa pequena ilha.

O tal do Mendonça, a uns 35 anos filho de pai português e mãe são-tomense, é bom de conversa, e contou coisas interessantes e pitorescas. Sobre os atrativos que não aparecem em guias turísticos, discorreu sobre a “Cervejaria do Holandês”, que desde 1900 e poucos é o principal ponto de happy hour de São Tomé. Que eu não deixasse de ir amanhã à noite e abusasse da curiosidade, pois o dono e o gerente gostam dos poucos brasileiros que aí vão. Que também não deixasse de ir à chocolateria de Cláudio Corallo, provar o melhor chocolate do mundo, também visitar uma roça de cacau e conhecer o queijo. E, no almoço, não deixasse de provar o “calulu de peixe” acompanhado de “angu de banana”. E, se gostasse de arriscar, deveria provar um “pilolo atômico”, no bar Maria João, mas cuidado! — disse ele.

Por último, contou, com sobra de conhecimento e experiência, do turismo das europeias, com tradição já de décadas. A origem teria sido uma inglesa, Anne, casada com um certo representante da Coroa Britânica que aqui moraram a mais de cem anos, início pois dos 1900. E essa Anne, embora bem casada, tomou gosto pelos nativos, na época escravos negros – ou apenas trabalhadores domésticos – importados do continente. Esses robustos e jovens homens que eram contratados para os afazeres domésticos, e circulavam pela casa com o “torso nu” (expressão do Mendonça) logo receberam a proteção e o aproveitamento íntimo dessa inglesa. Disse isso sem um sorriso maroto, e continuou:

— O marido talvez soubesse, pois é difícil não saber, não é? E não teria sido um desmancha prazeres da esposa, pois era duro para ambos estar nesta terra tão afastada da civilização e do convívio social. Depois que voltaram para a Inglaterra, Anne ainda retornou à ilha, primeiro com uma amiga, noutro ano com mais de uma amiga. A partir daí a visitação, primeiro de inglesas, depois de outros países, foi aumentando ano a ano. Hoje, em épocas de frio na Europa do norte, temos sido um destino interessante para cada vez mais mulheres que aqui vem para o lazer em nossas praias e prazer em nossas festas, o que muito nos dá gosto. Não se queixam de seus homens, ou de sua pouca competência, mas buscam avidamente carnes novas que se ponham nelas. As que já vieram uma vez voltam sempre, e há as de primeira viagem, mais tímidas e constrangidas por seus insidiosos desejos, mas que se mostram tão soltas quanto todas após a primeira bebida. Essas festas só acontecem à noite, nos bares ou nas praias, e terminam nos quartos. Mas depois que nos aprazamos um ao outro, retomamos a postura e durante o dia somos todos distintos trabalhadores e honradas turistas. Essa nossa atividade noturna tem caráter amadora, pois não há dinheiro envolvido. Afinal ambos se aproveitam e nenhum fica em dívida. Seria imoral cobrar honorários, pois também nós não pagamos honorários, e nos desfrutamos tanto quanto. É uma troca simples, um escambo de prazer por prazer. Nossas mulheres não se importam, pois – afinal – elas nos têm durante todo o tempo. E para os homens é uma forma de dar vazão quando dá uma vontade quase incontida de roçar as partes baixas nessas mulheres que vem de tão longe e com tamanha necessidade. Nos últimos anos tem vindo também alguns homens a procura desses prazeres, não com as mulheres são-tomenses, mas conosco mesmo. Mas isso não desperta interesse em nossos homens, e esses turistas se decepcionam.

Disse essa parte final me olhando firme, como que indagando qual era o meu time, e me afastei até onde o encosto da cadeira permitiu. Olhei o relógio, quase nove da noite, e o Mendonça aproveitou para levantar, pois tinha um encontro com uma turista alemã.

Repetiu em detalhes a sugestão de passeios no dia seguinte, enquanto eu buscava no bolso o dinheiro para o pagamento de seus serviços.

Paguei o que havíamos combinado pela jornada turística, um milhão e trezentos mil dobras, equivalente a uns 55 dólares. Considerando que rodamos a ilha e a gasolina custa quase 1,5 dólares, foi um ótimo preço.  Ao sair, pedi que me deixasse na tal Cervejaria do Holandês, pois amanhã à noite já não estaria aqui. Lá chegando, nos despedimos, sem nada programar para o dia seguinte.

O local confirmou a fama, com muitos e barulhentos jovens a conversar sobre esportes, praias, e também sobre estudar em Portugal. Entendi que não há variedade de cursos superiores em São Tomé e Príncipe, mas se consegue alguma ajuda governamental.

Depois de duas cervejas pequenas, de coloração avermelhada, que lembra minha preferida de rótulo vermelho da Eisenbahn, acompanhada por krokets holandeses com uma mostarda de mel, o hotel me pareceu longe demais. Mas consegui chegar ao quarto e até acertar a teimosa chave no minúsculo buraquinho.

Embora não seja inverno na Europa e não tenha visto nenhuma turista inglesa solta pelos corredores, por medida de segurança, tranquei bem a porta. Deveria deixar aberta? A esta hora de sono, nem sei mais!

Dou uma olhada no Jornal de São Tomé, pois faz 24 h que não acompanho o mundo. Não encontro nada sobre o Brasil. Será que não tem mais Brasil? Ou segue dormindo em berço esplêndido?

Termino por aqui. Vou dormir. Durmam vocês também. Boa noite.

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