Descobri logo cedo da manhã que o
“queijo”, indicado pelo Mendonça, não é aquele laticínio que pensei, mas um
ponto da Ilha a 55 km de São Tomé. Desisti do queijo. Resolvi dedicar a manhã à
cidade, ao porto, ao mercado, e a tarde ao chocolate.
Deixei meus pertences já
arrumados, para o check out à tarde, e saí caminhando em direção ao porto. Não
vi grande coisa, além de barcos de pesca. Entrei no mercado, com bastante movimento
naquela hora da manha. À procura de frutas e verduras. Também roupas artesanais. Dei um giro e saí.
O cacau brasileiro foi um grande
concorrente para a produção de São Tomé e Príncipe.
Parece que o segredo desse melhor
chocolate do mundo tem a ver com a produção artesanal de um Claudio Corallo,
que controla a qualidade duma produção verticalizada desde a plantação do
cacau, com frutos de linhagem especial, até a distribuição em pontos de venda
selecionados na Europa, com a marca São
Tomé. O Sr Cláudio, 84 anos, português de Sintra, fez questão de conversar
comigo, encantado com a visita de um brasileiro. Perguntou sobre o carnaval, o
samba e o Pelé. Por delicadeza, elogiei o Eusébio, o “pantera negra”
moçambicano. Senti que ganhei o velhinho. Depois de discorrer quase meia hora
sobre o Eusébio e as façanhas futebolísticas portuguesas, retornamos às
amenidades .
Me garantiu que o segredo da
longevidade é o chocolate, o vinho português, e as mulheres da ilha, e
perguntou se eu já tinha provado. Aprecio muito o vinho português — respondi —
e agora conhecerei este famoso chocolate! Como não mencionei as mulheres da
ilha, duas mulatinhas que empacotavam chocolates, me lançaram um olhar bastante
hospitaleiro. Homem sério que sou, fiz que não vi.
Fomos ainda visitar rapidamente
sua fazenda de cacau selecionado, e aprendi muito sobre esse fruto,
características das espécies, manejo da plantação, etc. Conclui que o Sr.
Cláudio Corallo não tem tido muitas visitas para dar vazão ao orgulho pelo seu negócio.
Recomendou muito que visitasse
sua cidade natal, pois ainda há muitos mistérios na estrada de Sintra, e,
entendendo que os chocolates derreteriam na continuação da viagem, preparou uma
sacolinha variada, apenas para tomar gosto.
Saí quase as três da tarde, pensando em almoçar no Tété, cozinha africana, especializado em frutos do mar. Descobri que só funciona à noite e, como já não estaria ali, fui ao Restaurante Porites, também de cozinha africana.
Simples, acolhedor, funciona o
dia todo, a qualquer hora, na orla da baia Ana Chaves.
Voltei ao hotel para pegar minha
maleta e fechar a conta, - o voo para Luanda partiria as 19h – e, no balcão
havia três inglesas que acabavam de chegar pelo voo da TAP. Lembrei do Mendonça.
Nenhuma das três cozinharia na primeira fervura, mas dariam um bom caldo.
O jovem recepcionista, muito
sensível a tudo que acontecia, perguntou se eu não gostaria de ficar mais uns
dias no hotel. Não é questão de gosto —
respondi — pois até tomaria gosto, mas minha viagem é longa, e tenho um
compromisso em Luanda. Acho que menti nessa parte.
As 19:10 meu voo de duas horas
para Luanda partiu. E, ao subir, vendo novamente e pela última vez aquela ilha, fiquei triste, quase sentindo o crescer de uma nostalgia amarga pela certeza de que nunca mais veria essas terras. Com dificuldade
de enxergar através da umidade do olhar, me voltei para dentro e lamentei me
apegar a desfechos apenas imaginados de futuros não acontecidos. Como nos
aprisionamos ao descartar a priori caminhos possíveis, antes mesmo que se nos
apresentem!
Chegaríamos em Luanda as dez e
pouco, pois estão adiantados em uma hora. Era um Boeing 737, meia boca, quase vazio.
De resto, foi tranquilo e o pessoal de bordo muito simpático. Não houve
atrasos, o aeroporto é moderno e está sendo ampliado, e vi muitos chineses àquela
hora da noite.
Agora, estou
acomodado no hotel. Um bom hotel, por sinal, com uma vista bonita da baia.
Amanhã tiro uma foto.
Antes de deitar ainda passo os
olhos no jornal de Angola, distribuído no voo, a procura de notícias do Brasil.
Só encontro uma: “Dilma e Merkel discutirão
investimentos”. Depois dos 7X1 é o mínimo que se espera.
Sem mais, me despeço por hoje.
Pois também hoje já é quase amanhã. Boa noite.
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